terça-feira, 9 de agosto de 2011

(Achados e Perdidos)



( Era um dia de manhã...)

Acordei sentindo uma saudade da saudade...
Resolvi então em um espasmo nostálgico revirar todas as minhas coisas guardadas.
Me surpreendi. Quando abri o armário tudo caíra em cima de mim. Era tanto entulho!
Sufocada, ainda me indaguei: Como coube tanto dentro de tão pouco? 
Lembranças mofadas. Sonhos hibernados. Tanto em tão pouco.

Então, num súbito rompante comecei a arremessar tudo janela a fora. Tudo! 
Fui ao poucos me desfazendo...
Roupas mofadas. Lembranças intactas. Amores enteiados. Promessas guardadas.
Assemelhava-se a um ritual. Enquanto seguia a partitura do meu anseio,
Me entregava a um ensaio nu aos passáros confabulantes nas árvores.
E seguindo sua orquestra sutil, continuava me desfazendo de tudo.
Fotos roubadas. Poesias enquadradas. Rimas anestésicas. Ponteiros. Gavetas. Calcinhas. Amores. Tudo!
Todos esvaindo-se junto a tarde.
Sentia meu corpo, então, despido de toneladas mentais... ficando leve...leve...

Por fim, dei-me por silenciosa a auscultar a entrada solene da noite.
Feito criança que se cansa da brincadeira, retomando a consciência e o folêgo, sentei-me num canto do quarto, jaz vazio, ocupado pela predominância de suas paredes brancas.
Mas senti uns olhos. Como quando a impressão de estar sendo observado.
E avistei, do outro lado da sala.
Uma gaveta. Isolada, inibida pelo espaço.
Me aproximei, certa de que seria meu último alívio janela a fora.
Certezas são tão prepotentes.

Como não lembrava! Claro! Ás vezes escondemos tão bem de nós mesmos que realmente esquecemos.
Mas engano foi achar que esconder seria sinonimo de superar.
E me vi ali, no meio do quarto, encharcada por lágrimas, ao ver sua foto dentro daquela gaveta.
Do que valeu-me desfazer de tudo se continuava ali sufocada? Impregnada de saudade. Impotente de quaisquer desfeita. Imersa em ti.
Aonde estavam os pássaros agora?

(Silêncio)

Fez-se dia, a noite em que joguei a mim pelo abismo, janela a fora.
Fez-se o encontro de mim -diriam os de bom senso- no insensato.

(Poeta retirando uma pena de sua asas e molhando-a em tinta, continua a escrever)

Neste dia descobri a leveza da saudade.
Hoje, sua foto continua lá na gaveta, dentro do quarto.
Acompanhada a tudo que numa tarde havia sido arremessado embora.
Porém, nunca mais precisei guardar nada, muito menos jogar tudo pelos ares. Apenas deixo a janela aberta.
Pois, assim como eu.
Tudo meu, criara...
Asas...

(Voa)